0

Cheia de vazio

Posted by Eve Rojas on 4:34 PM
Abro as portas e avisto da janela da memória um sempre passageiro que acabou agora. Uma eterna substituição da matéria, uma natureza constituída por átomos e vazio. Um rosto de expressões antigas, de pele enrugada pelo cotidiano das idéias, se acomodando no diálogo das representações do pensamento. Fixa, numa existência marcada pelo desassossego, o presente instante desaparece como um sonho no vão absoluto das coisas. Tudo parece ter sido. Até mesmo o signo perene da insegurança a ela surge e sub-jaz em meio a insaciabilidade das vontades numa absurda finalidade jamais determinada. É hora de manter os vazios no seu lugar. Deletar os vazios do vácuo e abrir espaços para os do vaso. Aqueles cheios de ar ou de água, plenos de efeito e ação. Nesse fluxo cognitivo de vastas emoções e racionalizações imperfeitas não há nada mais do que factualidade narrativa. Mas ainda há a necessidade dos vazios. Se a plenitude fosse constante não haveria lugar para o novo, só para o velho, inútil e gasto. A expectativa é de chegar ao porto com velas e mastros faltando, remodelar o barco, navegar outros oceanos. Sem carência, sem melancolia, partir e ancorar com boas saudades. É impressionante como a vida, no pequeno, acorre mais completamente. Nos pequenos desejos, nas pequenas tentativas de o amor contido saber acessar. Incondicionado e absoluto. Na marola é que se compreende o poder e a suavidade do mar. Entrementes, as ondas também vêem em ásperas farpas inacentuadas. Acidentalmente atingem a consciência disparando a fertilidade do conflito. Em comunhão, o puro é o firmamento, na rudeza e bondade da natureza visceral. Somos nós a caminhar nas estradas com áureas de amor inocente, enganados a dançar nos braços da esperança até chegar nos braços do parceiro alvorada, vulgo morte ascendência. Quem diria que há porvir e a gente ainda trata opção como prioridade. Antes do interdito, há o dirigido e ofertado. Prerrogativas e inquietações acionam o transe de percepção. E ela corre como se o infinito fosse bem ali na esquina, como se o amor fosse um encontro com o pôr-do-sol sob os arcos coloridos. Eita guria, o final do conto é abrupto, sem sensibilidade ou poesia. Então é assim? Desautomatiza a linguagem e abre o lírico da nova obra. Em cada detalhe as borboletas adejam, soprando as luzes, as sombras e as pétalas vermelhas. Deixa a brisa do real cênico tocar nas profundezas do humano. Os encantos são mais do que substitutos patéticos a se corromper entre o tempo e a desatenção. São o êxtase do inesperado, do agora, da lembrança da verdade, da expressão única, a flertar as voltas com a ilusão que não sabe se é ser ou se é inventar. Ainda há lugar, ainda há lugar. Há tanto mistério por trás das palavras, há tanto segredo nas coisas do mundo, há tanto eu nos seres do mundo. Vou trocando a pele, vou reiniciando os parágrafos. Não quero guardar a existência de tudo, quero provar, explorar, todas as possibilidades dos universos mais contestados. A face é inviolada e ela a incitar a mística do inconsciente sem rumo. Vai menina, se enche de vazio e mergulha em busca das vozes sem ira, na nascente da criação.

|

0 Comments

>

Copyright © 2009 PASSIONATE? All rights reserved. Theme by Laptop Geek. | Bloggerized by FalconHive. Distribuído por Templates