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Mãos atadas

Posted by Eve Rojas on 5:15 PM in , , , ,

Eu bebi. Despretensiosamente bebi. Na companhia daquele amigo querido, com aquele convite fim de ocasião. Falamos saudades, discutimos problemas, contamos amores, abrimos a mesa. Puxem as cadeiras amigos-colegas-desconhecidos. Afinal, beber é compartilhar. Compartilhar até transbordar a si mesmo, até inundar-se com o outro. De repente você. Força impetuosa de gardenia augusta, doçura delicada de jasmim. Luz a forçar a porta da minha atmosfera. Fuma meu cigarro, troca minha bebida, tenta mudar o meu horário, me desafia. Eu? Sem reação. Insolência bendita nessa constelação inebriante de libra. O que você quer, o que você é? Minha sina não guia sorte e você parece feliz em não saber. Expressa e aceita célebre o meu convite sem intenção. Usa minha palavra, toma no meu corpo e me pede poesia. Acha que reprime, que finge mas não é expectante no desenrolar desse enredo, quem sabe espetáculo em comédia enquanto atores a romancear. Tua mente é agitada, solta esse ímpeto original de lirismo involuntário. Dá para aferir o desconcerto? Estonteante desestruturação nesses teus olhos vivos de agora, espelho de diamante nas asas da fantasia. Dada a encenar, o real é dissimulação e a vontade... hum... A vontade é expressão impossível de mudar. Coração livre, infortúnio dos eternos românticos. Entusiasmo sem controle centrado na contemplação, no desejo, ardente e ingênuo. Delírio harmônico de juízo sem senso, profunda sabedoria dos amantes. Minha gratidão a esse retrato sábio, cínico e inigualável. Inteireza, arrebatamento e júbilo. Você. Desata. Desce a alça e deixa teu colo a mostra. Pede palco e chama o brinde. Um brinde às ilusões no shot de tequila. Vira o copo, sente a pele e aquece o corpo. Transita, muda a direção, me pede para ficar. E depois? Vou-me. Com o teu sorriso fácil nos olhos. Observando teus fragmentos poeticamente dispersos nos cantos de luz da cidade, nas rodas que reges dos convivas, nos arcos de mistério. Te encontro em outra madrugada. Experiencio uma tensão de memória pelo estado inacabado, na mesma medida em que este patético prazer discreto do “talvez” se sobrepõe a conquista. Espero e desapareço nessa relação sem lugar. A ausência é dita a partir de quem fica. Sem permuta, a imobilidade me toma sem saber o que em ti me fascina conforme vais. Descubro que até mesmo no reino do encantado é preciso viver o luto. Deixo-te ir mas te envolves nos meus braços, te deitas no meu colo. Intuitivamente acaricio teu rosto, teus cabelos, adormeço teu corpo num sentimento pleno de acolhimento fraternal, e de longe avisto o intratável do amor. E eu, rebotalho fátuo, invoco e me prendo na gravidade deste zelo sem ambição. Anseio a asfixia da verdade-ar para desacreditar na cumplicidade deliciosa de uma noite. Ei de ver pouso para além do teu céu de perdição. Essa tua beleza ameaçadora há de partir da minha estação sem incidentes, deixando um leve vestígio do intacto e puro. Tu és o entre-muitos, inatingível ao único, ao passo em que eu, ermo, fiz a minha entrada no mundo, sou do singular que quer o mar a dois. Sob a astuciosa quimera canto versos de nunca mais onde a morte é branda e a vontade latente. No casulo das minhas palavras me traio em discurso emprestado. O amor é surpreendentemente grande e multicolor. Esse alucinar não me angustia, sem me perder te ofereço delicadeza nos meus braços de amante ou colo de amiga. Tudo significa e eu escolho a deriva. Basta-me estar ali. Será loucura temperada? Fosse o caso a ação é tua e o desejo meu. Me interessas, me intrigas, me atrais como se tua pele completasse a minha, como se minha ária fosse o ápice da tua. Diante do constrangimento congelado, o não-dito é a voz mais expressiva, fascinação e alerta, mal-estar e gozo. No capital do imaginário te guardo comigo fascinante, mas meu coração é meu e de ninguém mais.

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